Se faz sentir, faz sentido

terça-feira, 19 de abril de 2011

19 DE ABRIL...

 Na data de hoje compartilho com vocês dois textos que achei interessantes. O primeiro trata-se de um poema de Reynaldo Jardim que recebi há alguns anos da camarada Lujan. Quando li pela primeira vez refleti muito sobre o Estado de Roraima, um estado essencialmente indígena que infelizmente ainda nega a importância da garantia dos direitos desses povos. Um exemplo disso é que na maioria das Escolas Públicas de Roraima ainda não existe um projeto intencional para se trabalhar os assuntos indígenas e na maioria das vezes quem o faz, faz de forma isolada e ainda encontra resistência e indiferença por parte de alunos e até mesmo de colegas de trabalho. É muito comum que os indígenas ou descendentes de indígenas que estudam nas escolas públicas  não se assumam como tal por medo de preconceitos, pois normalmente são vítimas de piadinhas dos colegas (que desconhecem sua história) por possuirem um jeito diferente de falar. Isso só nos leva a pensar o quanto temos que avançar nesse processo...
O outro texto é de Leonardo Sakamoto que de forma bastante irônica e inteligente tece críticas a forma como os índios vem sendo tratados em nosso país. Aproveito para parabenizar todos os indígenas do nosso Estado, do Brasil e da América Latina,  não pela data de hoje mas, pela sua enorme e incansável capacidade de resistência durante todos os dias. Tenho orgulho de ser descendente de um povo tão forte e guerreiro !!!

Texto I 

O QUE SE ODEIA NO ÍNDIO               
Reynaldo Jardim
O que se odeia no índio
não é apenas o espaço ocupado.
O que se odeia no índio
é o puro animal que nele habita.

O que se odeia no índio
é a sua cor em bronze arquitetada.
A precisão com que a flecha voa e abate a caça;
o gesto largo com que abraça o rio;
o gosto de afagar as penas e tecer o cocar;

O que se odeia no índio
é o andar sem ruído;
a presteza segura de cada movimento;
a eugenia nítida do corpo erguido contra a luz do sol.

O que se odeia no índio é o sol.
A árvore se odeia no índio.
O rio se odeia no índio.
O corpo-a-corpo com a vida se odeia no índio.
O que se odeia no índio é a permanência da infância.
É a liberdade aberta que se odeia no índio.


Texto II

Dia do Índio. Qual sociedade é composta por selvagens?

Criança branca pintada de índio em escola de classe média alta é hype. Criança índia desterrada esmolando no semáforo é kitsch. Índio só é fofo se vem embalado para consumo.
Hoje, 19 de abril, é Dia do Índio. Data boa para lembrar qual sociedade é, de fato, composta por selvagens. Vamos celebrar:
Dia do Índio se tornar escravo em fazenda de cana no Mato Grosso do Sul
Dia do Índio ser convencido que precisa dar sua cota de sacrifício pelo PAC e não questionar quando chega a nota de despejo em nome de hidrelétricas com estudo de impacto ambiental meia-boca
Dia do Índio armar um barraco de lona na beira da estrada porque foi expulso de sua terra por um grileiro
Dia do Índio ver seus filhos desnutridos passarem fome porque a área em que seu povo produziria alimentos foi entregue a um fazendeiro amigo do rei
Dia do Índio ser queimado em banco de ponto de ônibus porque foi confundido com um mendigo
Dia do Índio ser chamado de indolente
Dia do Índio ter ignorado o direito sobre seu território porque não produz para exportação
Dia do Índio ter negado o corpo de filhos assassinados em conflitos pela terra porque o Estado não faz seu trabalho
Dia do Índio se tornar exposição no Zoológico da maior cidade do país como se fosse bichinho
Dia do Índio ser retratado como praga em outdoor no Sul da Bahia por atravancar o progresso
Dia do Índio tomar porrada na Bolívia, no Paraguai, na Colômbia, no Peru, no Equador, no Chile, na Argentina, na Venezuela porque é índio
Dia do Índio ser motivo de medo de atriz de TV, que acha que um direito de propriedade fraudulento está acima de qualquer coisa
Dia do Índio entender que a invasão de nossas fronteiras é iminente e, por isso, ele precisa deixar suas terras para dar lugar a fazendas
Dia do Índio sofrer preconceito por seus olhos amendoados, sua pele morena, sua cultura, suas crenças e tradições
Enfim, Dia do Índio se lembrar quem manda e quem obedece e parar com esses protestos idiotas que pipocam aqui e ali. Ou será que nós, os homens de bem, vamos precisar de outros 511 anos para catequisar e amansar esse povo?

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